Na memória coletiva mundial, o dia 2 de outubro não é uma data a ser lembrada de forma dolorida “apenas” no Brasil. Assim como no Carandiru, um dos mais sangrentos e cruéis massacres do século passado aconteceu no México em um 2 de outubro: a “Chacina de Tlateloco”, em 1968.
Nesse dia, milhares de estudantes se encontravam em uma manifestação pacífica justamente contra a violência do Estado, na praça “De las Tres Culturas”, no bairro de Tlatelolco, centro da capital mexicana. Durante o ato, e há poucos dias dos jogos olímpicos que aconteceriam na mesma cidade, centenas de jovens foram brutalmente atacados e mortos pelas forças repressivas. Segundo números oficiais, mais de 15 mil balas foram disparadas contra estudantes indefesos. Oito mil militares participaram da ação e ao longo da noite perseguiram jovens que procuravam se refugiar nos prédios vizinhos.
Mais de 40 anos depois, o silêncio continua camuflando muitos detalhes sobre o que aconteceu naquele dia, a começar pelo número exato de mortos. Desde o início, o Estado mexicano trabalhou para confundir, ocultar e eliminar as informações, e a falta de responsabilização de quem realizou e de quem deu a ordem do massacre ainda persiste. Sabe-se que pelo menos 700 foram os feridos, enquanto o número de mortos estima-se entre 150 e 300 – alguns provavelmente foram jogados no oceano a partir de helicópteros militares. Milhares foram os detidos, muitos deles torturados.
A chacina de Tlatelolco marca o início do que depois seria conhecido como a guerra suja no México, uma tentativa do Estado de exterminar uma geração de jovens críticos, o movimento estudantil e a oposição política no próprio pais. Milhares de jovens foram obrigados a viver em clandestinidade, e o estado de Guerrero, de onde vêm os 43 estudantes desaparecidos de Ayotzinapa, foi um dos mais atingidos por
essa política de extermínio e repressão.
O movimento de 68 continua inspirando quem luta contra a opressão no México. A memória e as ideais de quem perdeu a vida para os fuzis militares naquele dia continuam vivas em inúmeras expressões de luta, como no Exercito Zapatista de Libertação Nacional (EZLN) e também nas Escolas Rurais Normais em todo o país. Os nossos 43 companheiros da escola Normal Rural Isidrio Burgos de Ayotzinapa, que um ano depois de serem atacados pelas forças repressivas mexicanas continuam desaparecidos, foram sequestrados pelo Estado em 26 de setembro, poucos dias antes de marchar para cidade do México onde homenageariam os estudantes chacinados em 1968.
Exatamente 24 anos depois do Massacre de Tlateloco, a polícia paulista assassinava covardemente ao menos 111 presos após uma rebelião na penitenciária do Carandiru. Tanto no México como aqui as chacinas, o encarceramento e as desaparições forçadas que sofremos não são casos isolados nem falhas do funcionamento do Estado, pelo contrário – são resultado do perfeito funcionamento do Estado como estrutura repressiva a serviço dos de cima. Tlateloco, Ayotzinapa, Carandiru, Osasco, Amarildo, Douglas, Cláudias, e tantas/os outras/os não serão esquecidas/os. Os Estados repressivos são parte de um sistema que procura o extermínio e o aniquilamento de toda pessoa, e de todo povo, que não é funcional para o sistema capitalista, ou que lute por um mundo livre de opressões, buscando assim plantar o medo para coagir e controlar o povo. Se a repressão não tem fronteiras, nossa resistência também não tem!
Não passarão!
por Nenhum(a)menos